quinta-feira, 3 de dezembro de 2015

Microcefalia segundo o espiritismo (parte 2 - resposta)

O correligionário Erick Machado comentou sobre o texto que eu havia escrito sobre o tema a fim de deixar os posicionamentos mais sãos. 

Então, vejamos o texto de Erick:

(Meus comentários entre parênteses).

A tese das expiações evolutivas ou das dores do parto


O surto não acomete “populações inteiras”. A prevalência da microcefalia, mesmo em surto 20 vezes maior que o comum, não chega a 1 em 1000 nascimentos no país. Para se ter uma ideia, a Síndrome de Down tem incidência de 1 a cada 800. E não é um surto pontual. Isso para não falar em todas as outras condições que afetam as crianças. A associação desses nascimentos a um suposto tempo que se finda é quimérica, falaciosa. As guerras já foram mais constantes, as corrupções, a violência, a injustiça de leis parciais, tudo já foi pior. Avançamos. Lentamente, mas avançamos. Conforme diz sabiamente “A Gênese”, não se darão abalos físicos como sinal dos tempos, mas unicamente morais. A microcefalia é uma questão de ordem física e, portanto, não pode ser vista, sob a ótica espírita, como nenhum tipo de sinal. É apenas o reflexo da nossa falta de cuidado físico com um vetor de transmissão de outras doenças, vetor que não combatemos adequadamente.


  • (A Vigilância Epidemiológica do Ceará se alarma exatamente porque há um aumento da incidência de microcefalia sem precedentes na coorte histórica dos últimos anos, e, segundo BOLETIM EPIDEMIOLÓGICO MICROCEFALIA de 30 de novembro de 2015 já existem casos em torno de 14 estados do Brasil, a maioria esmagadora no Nordeste. Acredito que isso justifica a utilização do termo "populações inteiras", ao menos como metonímia). 


  • (Sobre avançarmos lentamente, Kardec também coloca que há abalos súbitos que devastam toda uma forma de pensar, substituindo-a. De qualquer forma, Erick nos lembrou um texto magnífico do codificador presente em seu último livro "A Gênese", cuja profundidade não tenho como discutir aqui, mas que vale a pena ser lido: "São chegados os tempos". De todo modo, gostaria de me afastar da atitude de conceituar o surto da microcefalia em nossos recém-nascidos um sinal, mas uma situação de catástrofe que merece a preparação de nossos corações) 


Sobre o caráter dos Espíritos envolvidos


As condições do corpo nada mais são que as condições melhores para cumprimento de suas necessidades de crescimento na Terra. Como parcialmente levantado no texto, podem ser provas de Espíritos comuns, podem ser expiações de Espíritos maus, podem ser missões de Espíritos elevados, pode ser uma prova para os pais, mais que para o próprio. Notemos que, nessa condição, o Espírito estará privado de muitas escolhas morais que poderiam concorrer para o seu adiantamento, se tivessem maiores possibilidades. São inúmeros os caminhos. Nada se pode dizer quanto ao caráter de um Espírito baseado na dificuldade de sua condição material, de modo que os casos de microcefalia são exatamente iguais a qualquer outro nascimento em qualquer corpo: nada se pode afirmar sobre o Espírito reencarnante.

  • (Aqui Erick quis enfatizar que não devemos nos preocupar com o que a criança pode ter sido em outras vidas - são infinitas as possibilidades explicativas dessa forma de existir. Essa sua precaução nos ajuda muito a não cair no erro de julgar o ser humano que sofre em corpo malformado como sendo merecedor ou não desse mal. Precisamos, independente de passados, lhe oferecer abrigo e fortes braços que o sustentem agora.)  

Ademais, não existe “fragilidade” do perispírito. Existe a fragilidade ou força do Espírito, sobre a qual, insisto, o corpo nada diz. Se o corpo nada diz, dissertar sobre o caráter dos Espíritos e a microcefalia é dissertação vazia de significado.

  • (Talvez, de fato, não valha a pena insistir na especulação do passado analisando o corpo destas crianças microcefálicas. Mas, creio existir uma arqueologia da imortalidade esculpida em nosso corpo. Não entendo porque isso seria vazio de significado. Nos oferece mil nortes para encararmos a solidariedade das vidas sucessivas). 


Sobre a "culpa" da natureza


Não está conforme a visão espírita pensar que as catástrofes naturais possam refletir o estado de espírito dos homens e mulheres. Não existe base alguma na Doutrina Espírita para falar em “bolsões de miasmas”. O que repercute no mundo físico é a nossa ação física e as leis naturais. Nenhuma delas diz que podemos, por efeito de nossos pensamentos, atrair vírus e mosquitos para infectar populações. A nossa imprevidência no campo físico deu origem a essa possibilidade, e Espíritos reencarnantes que julgaram ou foram julgados como adequados para ocupar esses corpos se aproveitaram da oportunidade ensejada. Nada mais.


  • ("Bolsões de miasmas" soou estranho, não é? Deixo essa expressão em suspenso porque participa de um contexto de explicação de uma medicina antiga que a medicina moderna entende ter derrotado, mas que não estou tão certo de ter conseguido. Quando Erick diz que "o que repercute no mundo físico é a nossa ação física e as leis naturais" me parece desconsiderar completamente a ação, por exemplo, da prece que pode chegar até mesmo a curar doenças, acalmar fúrias à distância, enxugar lágrimas escondidas. A prece é uma ação simples cujo poder me faz crer que o mundo físico não é tão imune assim à ação de nossos pensamentos. Não vejo porque a influência de nossos pensamentos sobre a materialidade do mundo não possa ser também uma lei natural.)


A missão do Brasil


A corrente de pensamento de um Brasil missionário carece de fundamentações mínimas. Suas descrições entram em franco desacordo com o que se conhece acerca de Jesus pela ótica espírita, mostrando um ser eventualmente dolorido e amargurado, distante das descrições dos Espíritos Puros. Mostram um governador do planeta que desconhece o território pelo qual é responsável. O Brasil não é o melhor nem pior país. Não é o mais adiantado nem o mais atrasado. Não é o mais moralizado, nem o mais deturpado. Tem avanços e atrasos como qualquer outro. Nada há de especial no Brasil que possa distingui-lo como merecedor de qualquer missão mais especial que os demais. Há aqui corrupção moral o suficiente para ocupar nossas crianças, embora os países e os mundos sejam solidários na reencarnação dos Espíritos. Não há nada aqui que possa ser de mais valia a esses espíritos que não haja em outras terras, até mais abundantemente.

  • (Então, eis um contra-ponto de um estudioso da Doutrina Espírita sobre a questão do Brasil missionário. De todo modo, se o Brasil em si não guarda qualquer missão, nós o fazemos, cada um tendo que contribuir para o melhoramento do mundo e a materialização do amor ao próximo que Jesus nos aconselhou a fim de por término a esses ciclos de sofrimentos em que nos vemos enredados por tanto tempo).  

CONCLUSÕES QUE TIRO PARA MIM

  1. Devemos nos importar menos com as causas íntimas das aflições do que nos fortalecer para saná-las;
  2. Insistir menos nas especulações do nosso passado e investir mais nas ações de hoje;
  3. Considerar a prece como uma forte aliada para ajudar-nos na materialidade de nossos problemas;
  4. Não esquecer que, não importa quem sejamos, viemos sempre à terra com uma missão para o bem.

***

Retorno de Erick Machado

No mesmo sentido de síntese, aproximação e complementação de ideias, gostaria de deixar apenas pequenos pontos que, me parecem, vem ao encontro do que o amigo ponderou em todas as questões.

Dores do parto
- Como metonímia, acredito ser aceitável a expressão "populações inteiras". Minha questão era que existem condições comparáveis à microcefalia em bem maior quantidade, diariamente. Isso minimiza episódio do surto como oportunidade reencarnatória extraordinária. De resto, concordo com os apontamentos.

Caráter dos Espíritos envolvidos
- Aqui acredito que aqui nossa diferença seja mais de foco que de conteúdo. Concordo com você que, individualmente, a condição corporal seja norte para entender a solidariedade das vidas sucessivas. Perfeito. O que não acredito ser possível é a generalização de que uma condição corporal, como a microcefalia, possa determinar, de forma geral, o caráter dos Espíritos reencarnantes. Acho que há complementação de pensamentos: ambos acreditamos na mesma relação entre corpo e Espírito; mas eu me referi ao fato de que, dadas as múltiplas condições possíveis do Espírito, não é possível determinar, pelo corpo, qual delas está em questão, e você se referindo ao fato de que, ainda que não possamos apontar que condição é essa, não é sem razão que aquele Espírito vem naquele corpo.

Culpa da Natureza
- Entendo que apesar de uma divergência sutil, novamente temos mais uma questão de foco. O amigo tem razão quando lembra a prece como forma de interferência do espírito na matéria, via perispírito. Ainda assim, entendo que a interferência tem foco moral, antes de tudo. As lágrimas enxugadas e mesmo as doenças têm essência moral por trás de si. Contudo, embora entenda que, no caso da microcefalia, o pensamento não tenha interferido numa suposta "atração" do surto em si, acredito ter me equivocado ao dar a entender que apenas o físico interfere no físico, já que concordo que o pensamento pode interferir notoriamente na materialidade.

Missão do Brasil
- Concordo plenamente. Mesmo advogando contra a tese do Brasil missionário, não podemos perder de vista que a cada um de nós foram confiadas missões de acordo com nosso conhecimento e capacidade.

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