segunda-feira, 25 de maio de 2015

Sobre família espiritual



Pediram-me para falar sobre família espiritual e família material. 

Entendemos que há dois tipos de famílias: a de Espíritos que se unem por afinidade e a de que se unem por obrigação. 

Então, na palestra que elaborei decidi falar sobre as provas lógicas da existência da reencarnação que fazem com que ela seja a melhor resposta para as incoerências que existem na vida humana, justificando, assim, os sofrimentos que vemos como inexplicáveis. A ignorância das vidas sucessivas faz-nos ceder à hipótese do acaso, da imperfeita bondade de Deus ou do ateísmo ("Deus é desculpável na condição de não existir"). 

Contudo, provar a lógica não prova a existência, daí que Kardec entra na questão - o que faz a base científica do Espiritismo - da autoridade da revelação dos Espíritos. Grande parte deles se manifestavam no círculo de estudos de Kardec (o que já é uma prova da imortalidade da alma, já que se comunica após a morte), falando sobre seu breve retorno à carne. Depois, começaram a explicar sobre a grandeza desse princípio universal: o retorno do Espírito à matéria com o fim de evolução. 

O que isso tem a ver com famílias espirituais?

Decidi comentar a seguinte passagem do livro "Pesquisa sobre o Amor" do Prof. J. Herculano Pires:


Repete-se em cada nascimento, em cada penetração de um ser na existência, o episódio do Cavalo de Tróia. Ante a muralha do existencial os seres inexistentes vigiam como os guerreiros gregos, protegidos por seus deuses. Um não-ser ingênuo e puro, impotente e abandonado, é deixado ante a porta-fortaleza. Os troianos, os que vivem e existem na realidade plena, por trás da muralha, encantam-se com a doçura e a fragilidade daquela criança exposta aos perigos, abrem a porta e a recolhem, embalando-a em seus braços poderosos, sem dar ouvidos às profecias de Cassandra. Mas no interior da criança estão ocultos os conquistadores experientes. A existência, essa Tróia cercada de muralhas no planalto da vida, vai ser conquistada ferozmente pelos instintos de conquista e domínio que explodirão no anoitecer. Cada não-ser busca a sua Helena raptada, a sua contrafação que o completará no plano existencial. Não há guerra gratuita, batalha sem objetivo. Cada ser lançado na existência é, ao mesmo tempo, um vetor energético e uma busca emocional de realização humana. Muito antes de o primeiro eclodir da virilidade na puberdade a marca do amor definia o não-ser como o conquistador da existência. [grifo meu]

"... no interior da criança estão ocultos os conquistadores experientes." Que comparação fantástica! Infelizmente, ela traz a imagem da guerra para dentro do lar. Todavia, é o que referenda toda a história da humanidade. Somos uma civilização de guerra. Nossa história é uma de matar a tribo que mora ao lado, entendendo que o ambiente é pouco para a sustentação de todos. 

É verdade que há pais e filhos que se amam sinceramente, mas não podemos negar a realidade dos múltiplos conflitos trágicos que mancham a história da família. Os que se amam sinceramente são os que possuem o parentesco espiritual, os que não se amam, estão temporariamente unidos por laços biológicos. 

Como tudo na natureza criada por Deus, há providência. Os laços biológicos, o enfrentamento dos conflitos diários, a busca por conseguir dialogar, a consciência filial que pressiona o filho a cuidar do pai doente, tudo isso são vetores direcionados para a dissolução de outros laços: os do ódio. O indivíduo que matou outro em existência pretérita, hoje lhe recebe como filho no ventre, aprendendo a lição de quanto vale gerar e fazer crescer uma vida. 

Faço um convite ao final: para que deixemos de aprender as lições do amor através das dores. O nosso planeta escapará da pecha de provas e expiações quando aprender a fazer o bem por amor à virtude, e não mais por medo do castigo. 

sábado, 23 de maio de 2015

Sobre sonhos com pessoas mortas (& cia)



"Tive um sonho com meu pai... com minha avó... com meu esposo... com uma pessoa que faleceu logo após... com uma amiga... e ele (ou ela) estava assim... me disse isso... pediu que eu dissesse isso para fulano... aconselhou-me isso... Era muito real!"

Várias pessoas já me abordaram sobre esse assunto. O que poderia significar? 

Quando elas vem perguntar para mim, sabem que sou espírita. Não estão abordando o Allan médico. Então, já supõem o que vou dizer: endossarei a sensação que elas têm de que aquilo foi real, aconteceu de fato. É o que o Espiritismo diz. Quando dormimos, o corpo repousa e o Espírito perambula por lugares onde a vontade, antes de dormir, estava afim. Encontra-mo-nos com pessoas com quem travamos diálogos corriqueiros ou que nos fazem revelações, nos fazem de mensageiros, nos orientam. 

Por vezes se acorda extremamente cansado. Não se deve ter andado por bons lugares. Outras vezes se está leve. Quão prazeroso deve ter sido esse encontro! Quando voltamos para o corpo, a percepção espiritual é perturbada pela densidade corporal, e as imagens tornam-se truncadas, enigmáticas. Muitas vezes esquecemos do que ouve, então dizemos: não sonhei. 

O sonho, portanto, pode ser uma lembrança do que aconteceu com o Espírito enquanto o corpo dormia. Mas, não sejamos radicais, pode ser também algum resquício de atividade cerebral que, então, misturar-se-á com as lembranças da vida espiritual deixando os sonhos ainda mais confusos. Também pode ser o que os freudianos dizem: cenas simbólicas de experiências recalcadas que se reverberam no aparelho psíquico. Todavia, escutem só essa, quando um psicanalista trabalha muito com o conteúdo dos sonhos, um Espírito protetor da pessoa analisada pode mandar mensagens através dos sonhos que ajudem ao psicanalista entender o caso da paciente, dando nortes na condução da terapia. 

Temos que entender a realidade como um emaranhado tecido em que os novelos do mundo espiritual se entrelaçam com as experiências materiais. Dividimos os planos por questão didática, mas a verdade é que as coisas estão tão imbricadas que algumas divisões obscurecem mais do que explicam. Importante, de vez em quando, fazermos esse esforço mental de nos entender como seres conectados em teia. Isso vale para as vidas múltiplas. O passado se engalfinha com o presente projetando um futuro de forma dinâmica. O presente elabora o passado, gerando o futuro sempre mais promissor, reza o otimismo espírita. 

- O que fazer com estes sonhos reveladores? - acho que é o que mais querem saber de mim. 

Sem se fixar na mensagem literal que lhe foi passado, deixar as portas abertas para encontrar o significado que, em momento oportuno, poderá ser utilizado em serviço que se pretendia com a mensagem. Você é um intermediário, o momento certo de utilizar o que lhe foi dado aparece. Importa ir em busca de alguma forma, mas sem muita insistência a fim de que não vire uma obsessão. Quando o receptor estiver pronto, e o meio for oportuno, a mensagem ficará clara.  

sexta-feira, 15 de maio de 2015

Sobre doutores palhaços



Convidaram-me para falar sobre o filme do médico Patch Adams, produção cinematográfica que vulgarizou a figura do doutor palhaço pelo mundo. 

Ficava complicado falar coisas muito formais depois de um filme daquele tão transgressor das tradições. Portanto, fui atrás de fazer uma ciranda e, a partir dela, tecer considerações. 

A nossa evolução espiritual é feito uma ciranda que cresce para o alto. De vez em quando nos tomamos fazendo parte de situações muito semelhantes, mas estamos com uma cabeça diferente. Com o Patch aconteceu isso. Sua irreverência para com aquele médico empavonado, reitor de sua faculdade, se dava em virtude de sua já experiência do sofrimento. 

A idade pesa no enfrentamento das situações difíceis. Algumas pessoas podem olhar pelo lado ruim e se cansar com o peso da repetição dos problemas. Outras podem olhar pelo lado bom e ver que, com a idade, se está mais forte para enfrentar aqueles males que, hoje, parecem nada de tão risíveis. O tempo redimensiona as grandezas.

Conheço uma psicóloga que, com mais de quarenta anos, decidiu entrar na faculdade de medicina para continuar sua história agora como médica. Nunca vi uma pessoa tão apaixonada, engajada, diplomática e revolucionária. Está fazendo tudo o que dá na telha para ser o que quer ser, e está indo bem. 

Esses Espíritos nos ensinam que não podemos desistir de nossos sonhos. Pra falar a verdade, somos feitos mais da matéria dos sonhos do que das células. É o que nos move, o que nos alimenta, o que nos diferencia do que já não somos, o que nos assemelha ao que seremos. 

Depois falei sobre minha experiência como palhaço de hospital, o quanto entrei em áreas que nunca imaginei entrar antes, como por exemplo, dentro do abraço e das lembranças eternas de uma senhora que cuidava da limpeza de lá, dentro de seu sorriso a me acolher quando me via, dentro do seu carinho. 

Convidei um integrante atual deste grupo de palhaçoterapia que participei para falar sobre a experiência "escrota" de ainda ver médicos "escrotos" na faculdade de medicina. Mas, então, ele falou de seus sonhos: de como gostaria de ser um médico que olharia sempre o paciente de forma integral, buscando não esquecer suas múltiplas dimensões. Falou ainda sobre o seu amor por um certo personagem de um conto de fadas, um leão rei que acolhia as pessoas sempre com carinho, acreditava nelas e chegou a dar a própria vida dele para que elas vencessem o mal e tornassem o mundo melhor. 

Lembrei-me de Jesus, o quanto ele foi médico de almas, brincou com crianças, revolucionou a história e parece ainda nos guiar lá do alto da ciranda que dança junto com muitos outros grandes Espíritos. Esse leão que nos acolhe com o olhar e mergulhou em nossa história para nos fazer mais senhores de nós mesmos e responsáveis pela restauração do equilíbrio do mundo. 


domingo, 10 de maio de 2015

As mães



Em certo lugar do Espiritismo, dizem que o instinto materno é o lugar pelo qual Deus se manifesta cuidando de seus filhos. Em outro lugar, dizem que aquele que aceita o papel de mãe, se fôssemos computar em ganhos materiais, a pessoa ganha o dobro do que qualquer outro trabalho na terra.

Ter um filho é estar aberta, do momento que o acolhe em diante, para a surpresa diária que ele representa. Quando o gesta, parecia ser parte de si, mas era um estranho que lhe consumia na medida que ia te preenchendo. Quando o ama, não se sabe como essa vida estava podendo ser sem ele, e o tempo vai se tornando pouco para si na medida em que vai sendo um outro tempo para dois. 

O filho é sempre a continuação de histórias: a sua, a de quem ajudou a gerá-lo, a dele.

Felicidades para todos aqueles que naquele dia do convite disseram sim!

sexta-feira, 8 de maio de 2015

Pecadinhos



Quando estava na alfabetização, a tia pediu que fizéssemos uma redação de cinco linhas no nosso caderninho de caligrafia. Eu não sabia fazer, não conseguia, não vinha ideia. Papai sentou do meu lado, tentou me inspirar, sugerir, orientar. Eu relutei o quanto pude. Acho que era mais orgulho de não fazer feio. Então, pegou meu caderno, preocupado que eu fosse chamado a atenção, e fez as cinco linhas por mim tentando imitar minha letra. 

Na evangelização espírita infantil, a tia pediu que escrevêssemos uma prece com nossos próprios sentimentos, palavras. Fiquei com receio de fazer algo feio, que não fosse a altura de Deus. Pedi que papai fizesse algo para me inspirar. Ele escreveu uma página linda. Decidi não parodiar. Entreguei a dele. A tia da evangelização perguntou, com olhos esbugalhados, se eu que havia feito (ele tinha feito com uma letra de forma fácil de imitar, poderia ser a minha). Eu disse que sim! Ela foi mostrar para a outra tia, e as duas ficaram me olhando como se eu fosse um Espírito superior encarnado. 

Vejam aí o naipe do Espírito superior!

P.S.: Pensei sobre isso ao ver as cobranças que estava me fazendo sobre a evolução moral de meu filho. Se não sou um Espírito superior, tão pouco sou um dos piores Espíritos que conheço. Saudades de papai! Sua careca me daria muitos conselhos de quem sobreviveu a sete filhos.